____Os
que não admitem a realidade das manifestações_físicas geralmente atribuem à fraude os efeitos produzidos. Fundam-se em que os prestidigitadores
hábeis fazem coisas que parecem prodígios, para quem não lhes conhece os
segredos; donde concluem que os médiuns
não passam de escamoteadores.
____Há,
em suma, uma consideração que não escapará a quem quer que reflita um pouco.
Existem, sem dúvida, prestidigitadores
de prodigiosa habilidade, mas são raros.
____Se
todos os médiuns praticassem a escamoteação,
forçoso seria reconhecer que esta arte fez, em pouco tempo, inauditos
progressos e se tornou de súbito vulgarissima, apresentando-se inata em
pessoas que dela nem suspeitavam e, até, em crianças.
[17b - página 414 item 314] |
____De
todos os fenômenos espíritas, os que mais se prestam à fraude são os fenômenos
físicos, por motivos que convém considerar.
- Primeiramente,
porque impressionam mais a vista do que a inteligência, são, para prestidigitação,
os mais facilmente imitáveis.
- Em
segundo lugar, porque, despertando, mais do que os outros, a curiosidade,
são mais apropriados a atrair as multidões; são, por conseguinte, os mais
produtivos.
____Desse
duplo ponto de vista, portanto, os charlatões
têm todo interesse em simular as
manifestações desta espécie; os espectadores, na sua maioria estranhos à
ciência, acorrem, geralmente, em busca muito mais de uma distração do que de
instrução séria e é sabido que se paga melhor o que diverte do que o que
instrui.
[17b - página 415 item 315]
____A
imitação de todos os fenômenos espíritas não é igualmente fácil. Alguns há que evidentemente desafiam a habilidade da prestidigitação :
tais, notadamente, salvo o emprego das tramóias e do compadrio:
- O
movimento dos objetos sem contacto,
- a
suspensão dos corpos pesados no ar,
- as
pancadas de diferentes lados,
- as
aparições, etc.,
____Por
isso dizemos que o que necessário se faz em tal caso é observar atentamente as
circunstâncias e, sobretudo, ter muito em conta o caráter e a posição
das pessoas, o objetivo e o interesse que possam ter em enganar. Essa a melhor
de todas as fiscalizações, porquanto circunstâncias há que fazem desaparecer
todos os motivos de suspeita. Julgamos, pois, em princípio, que se deve
desconfiar de quem quer que faça desses fenômenos um espetáculo, ou objeto de
curiosidade e de divertimento, e que pretenda produzi-los à sua vontade e da
maneira exigida, conforme já explicamos.
____Nunca
será demais repetir que as inteligências ocultas que se nos manifestam têm
suas suscetibilidades e fazem questão de nos provar que também gozam de livre-arbítrio
e não se submetem aos nossos caprichos.
____Será
suficiente assinalemos alguns subterfúgios, que costumam empregar-se, ou que o
podem ser em certos casos, para premunirmos contra a fraude os observadores de
boa-fé. Quanto aos que se obstinam em julgar, sem aprofundarem as coisas, fora
tempo perdido procurar desiludi-los.
[17b -página 417 item 318] |
A
escrita_direta
ainda é mais facilmente imitável. Sem falar dos agentes químicos bem
conhecidos, para fazerem que em dado tempo a escrita apareça no papel branco, o
que se consegue impedir com as mais vulgares precauções, pode acontecer que,
por meio de hábil escamoteação,
se substitua um papel por outro. Pode dar-se também que aquele que queira
fraudar tenha a arte de desviar as atenções, enquanto escreva com destreza
algumas palavras. Alguém nos disse ter visto uma pessoa escrever assim
com um pedaço de ponta de lápis escondido debaixo da unha.
[17b -página 419 item 320]
____Um
dos fenômenos mais comuns é o das pancadas no interior mesmo da substância da
madeira, com ou sem movimento da mesa, ou do objeto de que se faça uso. Esse
efeito é um dos mais fáceis de ser imitado, quer pelo contacto dos pés, quer
provocando-se pequenos estalidos no móvel. Há, porém, uma artimanhazinha
especial, que convém desvendar. Basta que uma pessoa coloque as duas mãos
espalmadas sobre a mesa e tão aproximadas que as unhas dos polegares se apóiem
fortemente uma contra a outra; então, por meio de um movimento muscular
inteiramente imperceptível, produz-se nelas um atrito que dá um ruído seco,
apresentando grande analogia com o da tiptologia íntima. Esse ruído repercute
na madeira e produz completa ilusão. Nada mais fácil do que fazer que se
ouçam tantas pancadas quantas se queiram, o rufo do tambor, etc., do que
responder a certas perguntas, por um sim, ou um não, por números, ou mesmo
pela indicação das letras do alfabeto.
____Estando-se
prevenido, é muito simples o modo de descobrir a fraude. Ela se torna
impossível, desde que as mãos sejam afastadas uma da outra e desde que se
tenha a certeza de que nenhum outro contacto poderá produzir o ruído. Além
disso, as pancadas reais apresentam esta característica: mudam de lugar e de
timbre, à vontade, o que não pode dar-se quando devidas à causa que
assinalamos, ou a qualquer outra análoga. Assim é que deixam a mesa, para se
fazerem ouvir noutro móvel qualquer, com o qual ninguém se acha em contacto,
nas paredes, no forro, etc., e respondem a questões não previstas.
[17b - página 418 item 319] |
____O
fenômeno do trazimento de objetos, de fora para o lugar onde se efetua a
reunião, não se presta menos à trapaça e facilmente se pode ser enganado por
um escamoteador mais ou menos destro, sem que haja mister se trate de um prestidigitador
profissional. No parágrafo especial que acima inserimos, os próprios
Espíritos determinaram as condições excepcionais em que ele se produz, donde
lícito é concluir-se que a sua obtenção facultativa e fácil deve, quando
nada, ser tida por suspeita. A escrita direta está no mesmo caso.
[17b - página 419 item 321] ____No
capítulo Dos médiuns especiais, mencionamos, segundo os Espíritos, as
aptidões mediúnicas comuns e as que são raras. Cumpre, pois, desconfiar dos
médiuns que pretendam possuir estas últimas com muita facilidade, ou que
ambicionem dispor de múltiplas faculdades, pretensão que só muito raramente
se justifica.
[17b - página 419 item 322]
____As manifestações_inteligentes são, conforme as circunstâncias, as que oferecem
mais garantias; entretanto, nem mesmo essas escapam à imitação, pelo menos no
que toca às comunicações banais e vulgares. Pensam alguns que, com os médiuns_mecânicos, estão mais seguros, não só pelo que respeita à
independência das ideias, como também contra os embustes; daí o preferirem
os intermediários materiais. Pois bem! é um erro. A fraude se insinua por toda
parte e sabemos que, com habilidade, até mesmo uma cesta, ou uma prancheta que
escreve pode ser dirigida à vontade, com todas as aparências dos movimentos
espontâneos.
____Só
os pensamentos expressos, quer venham de um médium mecânico, quer de um
intuitivo, audiente,
falante ou vidente, afastam todas as dúvidas. Há
comunicações, tão fora das ideias, dos conhecimentos e mesmo do alcance
intelectual do médium, que só por efeito de estranha obliteração se poderia
atribui-las a este último. Reconhecemos que o charlatanismo
dispõe de grande habilidade e vastos recursos, mas ainda lhe não descobrimos o
dom de dar saber a um ignorante, nem espírito a quem não o tenha.
____Em
resumo, repetimos, a melhor garantia está na moralidade notória dos médiuns e
na ausência de todas as causas de interesse material, ou de amor-próprio,
capazes de estimular-lhes o exercício das faculdades mediúnicas que possuam,
porquanto essas mesmas causas poderiam induzi-los a simular as de que não
dispõem.
[17b - página 420 item 323] |
____é muito provável que os médiuns_verdadeiros recorram algumas vezes propositadamente à fraude, quando o poder supra-sensível que produz os fenômenos não seja bastante eficaz. Para isso concorrem:
- primeiro, a tentação de atrair um apreço exagerado à sua presente mediunidade
- e, depois, a tentação do lucro pecuniário, que falhará se o fenômeno não se der.
____Alguns médiuns fazem da exibição de suas faculdades um meio de vida; e se, às vezes, suprem os fenômenos reais por artimanhas, não devemos inferir que, por ser falso em uma coisa, ele o seja em todas.(*) ____Já muitas vezes se tem provado que a acusação de fraude é, frequentemente, o resultado da completa ignorância do acusador, pois este se aventura a tirar conclusões aparentemente sinceras, mas que, se ele possuísse mais algum conhecimento, se lhe apresentariam como duvidosas ou falsas.
- Quanto aos intitulados expositores do Espiritismo, ocasionalmente tem sucedido que pessoas dotadas de alguma faculdade_mediúnica, não podendo tirar das suas manifestações um meio de vida, e tornando-se desafetas aos espíritas, por estes repelirem suas pretensões, têm procurado o patrocínio dos que combatem os fenômenos. Se tiverem facilidade de falar, se possuírem muita presença de espírito e alguma perícia na arte de prestidigitação, persuadirão facilmente os inexperientes de que algumas das suas fraudes são idênticas aos verdadeiros fenômenos mediúnicos.
- Quanto aos fenômenos que não podem ser imitados fraudulentamente, elas os produzem com o auxílio do gabinete e das cortinas, pela cooperação de Espíritos_de_ínfima_classe. Em tais casos, têm sempre uma escusa para não exibir ao público o seu modus operandi. Dirão que depois explicarão porque não podem divulgar o seu segredo, enquanto ele for seu ganha-pão. Muitos desses impostores têm conseguido atrair numerosos assistentes e colher da parte dos inimigos do Espiritismo o auxílio que os adeptos não lhes dariam.
____Qualquer expositor que afirmar ser a clarividência e a pneumatografia fraudes demonstráveis pode com certeza ser considerado como mistificado por si mesmo ou um petulante mistificador. Sua pretensão ao título de emérito prestidigitador não passa de uma suposição e, no geral, conhece que ela é falsa. Seguidamente, durante os últimos trinta e três anos, recebi cartas de amigos que, confiando muito em sua própria sagacidade, me informavam de que certos fenômenos que eu havia proclamado como genuínos estavam provados pelo expositor ambulante como simples embustes. Em todo caso o “expositor” acaba sempre por ser conhecido como impostor ou pretensioso pantomimeiro; e então nenhum dos fenômenos geralmente aceitos pelos investigadores cuidadosos e experimentados no mundo todo será apeado de sua verdadeira base.
____O fato de muitas pessoas que se dizem espíritas terem prejudicado a sua causa, recorrendo à luz mediúnica para resolverem seus negócios e assuntos domésticos, sob a inspiração de sua própria razão e sentimento de direito, tem feito nascer um amontoado de prejuízos entre os que não investigaram por si mesmos os fenômenos. Se o investigador deseja realmente a verdade, depressa se libertará das objeções que podem ter-se originado da credulidade dos neófitos ou das fraudes dos médiuns mercenários. Ficará sabendo que há fenômenos genuínos justificando a crença em uma força sobre-humana e espiritual. Se o grande assunto tem sido vituperado, a culpa é toda daqueles que daí fogem cautelosamente.
____Um eminente jurisconsulto, ocupando uma das mais altas posições judiciárias por escolha do povo de seu Estado, em data de 10 de julho de 1880 escreveu o seguinte:
- “Minhas primeiras tentativas em experiência deram-me a convicção de que eu havia caído nos laços da fraude, e os princípios perigosos e imorais, professados pelos que pareciam ser chefes da Causa, impediram que por alguns anos me ocupasse com isso. Nos últimos seis anos, porém, tendo a Causa sido expurgada de muitas dessas fraudes, a luz me veio casualmente. Trabalhando nesse assunto durante trinta anos e tendo observado a sua evidência nos últimos doze anos, dei-lhe o melhor das minhas faculdades, sempre dirigido por um gênio naturalmente céptico, e consegui convencer-me de duas grandes verdades elementares, a saber:
____Levado a essa conclusão, admiti somente aquilo que, sob o ponto de vista da evidência, resistisse ao mais severo e céptico escrutínio da razão, libertada da credulidade e das superstições.”
(*) Um espírita inglês, muito familiarizado com esses fenômenos, escreveu (novembro de 1878): “Posso até admitir que o médium sensitivo pode, em seu estado normal, ser levado a trapacear, por uma influência do meio. Ele merece antes lástima do que condenação. Assisti às sessões escuras, públicas, de Williams, Herne, Eglington, Bastian e Taylor, e vi o que considero manifestações reais. Centenas de pessoas têm visto a mesma coisa em suas próprias residências, com os mesmos médiuns e em circunstâncias em que o embuste era impossível. Por isso, não creio que uma pessoa que seja realmente suscetível arrisque de propósito a sua reputação, empregando uma fraude palpável e fácil de ser descoberta. Quanto mais apurada for a suscetibilidade, mais fácil se tornará a fraude. Frequentemente, se a sessão é muito longa e o médium fica exausto, as baixas influências se manifestam.” [97 - páginas 35/37] - Epes Sargent (1813-1880)
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