____" ...No entanto, o nosso amigo médico não encontra na organização_psicofísica da médium elementos afins perfeitos:
- nossa colaboradora não se liga a ele através
de todos os seus centros
perispirituais
- não é capaz de elevar-se à mesma
freqüência_de_vibração em que se acha o comunicante
- não possui suficiente espaço interior para
comungar-lhe as ideias e conhecimentos
- não lhe absorve o entusiasmo total pela Ciência,
por ainda não trazer de outras_existências, nem haver construído, na experiência atual, as
necessárias teclas evolucionárias, que só o trabalho sentido e vivido lhe
pode conferir.
____Eulália manifesta, contudo, um grande poder o da boa vontade criadora, sem o qual é impossível o início da
ascensão às zonas mais altas da vida. É a porta mais importante, pela qual se
entenderá com o médico desencarnado. Este, a seu turno, para realizar o nobre
desejo que o anima, vê-se compelido, em face das circunstâncias, a pôr de
lado a nomenclatura oficial, a técnica científica, o patrimônio de palavras
que lhe é peculiar, as definições novas, a ficha de renome, que lhe coroa a
memória nos círculos dos conhecidos e dos clientes. Poderá identificar-se com Eulália para a mensagem precisa, usando também, a seu turno, a boa vontade; e,
adotando esta forma de comunicação, valer-se-á, acima de tudo, da comunhão
mental, reduzindo ao mínimo a influência sobre os centros neuropsíquicos;
é que, em matéria de mediunismo,
há tipos idênticos de
faculdades, mas enormes desigualdade nos graus de capacidade receptiva, os quais
variam infinitamente, como as pessoas ... ____... Calderaro, o orientador espiritual, faz uma observação: todas
as pessoas, participantes da reunião, em posição receptiva estão absorvendo a emissão mental do
comunicante (do médico), cada qual a seu modo ... ____...Circulei a mesa e vi que os raios de força positiva do
mensageiro (do médico) efetivamente incidiam em oito pessoas. Reconheci que o tema central
do desejo formulado por nosso amigo, no tocante ao projeto de assistência aos
enfermos, alcançava o cérebro
dos que se conservavam em atitude passiva; na tela animada de concentração
de energias_mentais,
cada irmão recebia o influxo sugestivo, que
de logo lhes provocava a livre associação dos psicanalistas.
____Fixei as particularidades com atenção.
____Ao receberem a emissão de forças do trabalhador do bem (do médico),
- um cavalheiro recordou
comovente paisagem de hospital
- Outro rememorou o exemplo
de uma enfermeira bondosa que com ele travara relações
- Outro abrigou pensamentos
de simpatia para com os doentes desamparados
- duas senhoras se
lembraram da caridosa missão de Vicente de Paulo
- a uma velhinha acudiu a
ideia de visitar algumas pessoas acamadas que lhe eram
queridas;
- um jovem reportou-se, em silêncio, a notáveis
páginas que lera sobre piedade fraternal para com todos os
semelhantes afastados do equilíbrio físico.
____Examinei também as três pessoas que se mantinham impermeáveis ao serviço
benemérito daquela hora. Duas delas contristavam-se por haver perdido uma
sessão cinematográfica, e a outra, uma senhora na idade provecta,
retinha a mente na lembrança das ocupações domésticas, que supunha
imperiosas e inadiáveis, mesmo ali, num círculo de oração, onde devera
beneficiar-se com a paz.
____Somente Eulália recebia o apelo do comunicante com mais nitidez.
Sentia-se ao seu lado: envolvia-se em seus pensamentos; possuía-se, não
só de receptividade, mas também de boa disposição para servi-lo.
____Decorridos alguns minutos de expectativa e de preparo silencioso, a mão
da médium, orientada pelo médico e movida em cooperação com os estímulos
psicofísicos da intermediária, começou a escrever, em caracteres
irregulares, denunciando o natural conflito de <<dois
cosmos psíquicos>>
diferentes, mas empenhados num só objetivo — a produção de uma obra
elevada.
____Mais alguns momentos, e fazia-se a leitura do pequeno texto obtido. O
comunicado era vazado em forma singela, como um apelo fraternal:
- Meus
irmãos — escrevera o emissário —, que Deus nos abençoe.
- Identificados
na construção do bem, trabalhemos na assistência aos enfermos,
necessitados de nosso concurso entre os longos sofrimentos da provação
terrestre, O serviço pertence à boa vontade unida à fé viva. E a
sementeira reclama trabalhadores abnegados, que ignorem cansaço,
tristeza e desânimo.
- Sigamos
para a frente.
- Cada
pequenina demonstração de esforço próprio, nas realizações da caridade, receberá do Senhor a Divina Bênção.
- Aprendamos,
pois, a socorrer nossos amigos doentes. Através de espessa noite de
dor, sofrem e choram, muita vez em pleno abandono.
- Não
vos magoará a contemplação de tal quadro? Lembremo-nos dAquele
Divino Médico que passou, no mundo, fazendo o bem. DEle receberemos a
força necessária para progredir. Estará conosco na grande jornada
de comiseração pelos que padecem.
- Fiamos
em vós, em vossa dedicação à causa da bondade evangélica.
- A
estrada será talvez difícil e fragosa; entretanto, o Senhor
permanecerá conosco.
- Prossigamos,
intimoratos, e que Ele nos
abençõe agora e sempre.
____O comunicante assinou o nome, e, daí a alguns minutos, encerravam-se os
serviços espirituais da noite.
____O presidente da sessão, seguido pelos demais companheiros, iniciou o
estudo e debate da mensagem. Concordou-se em que era edificante na essência,
mas não apresentava índices concludentes da identificação individual;
não procedia, possivelmente, do conhecido profissional que a subscrevera;
faltavam-lhe os característicos especiais, pois um médico usaria
nomenclatura adequada, e se afastaria da craveira comum.
____E a tese_animista apareceu como tábua de salvação para todos.
Transferiu-se a conversação para complicadas referências ao mundo
europeu; falou-se extensamente de Richet e do metapsiquismo internacional;
Pierre Janet, Charcot, De Rochas e Aksakof eram a cada passo trazidos à
balha.
____O comunicante, em nosso plano de ação, o médico, dirigiu-se, desapontado, ao meu
orientador e comentou: — Ora
essa! jamais desejei despertar semelhante polêmica doméstica.
Pretendemos algo diferente. Bastar-nos-ia um pouco de amor pelos enfermos,
nada mais.
____Calderaro sorriu, sem dizer palavra, e evidenciando preocupação em
objetivo mais importante, acercou-se de Eulália, entristecida.
____A médium ouvia as definições preciosas com irrefreável amargura.
____Turvara-se-lhe a mente, agora, empanada por densos véus de dúvida. A
argumentação em curso nublava-lhe o entendimento. Marejavam-se-lhe os
olhos de lágrimas, que não chegavam a cair.
____Abeirando-se
dela, o instrutor falou-me, bondoso: — Nossos amigos encarnados nem
sempre examinam as situações pelo prisma da justiça real. Eulália é
colaboradora preciosa e sincera. Se ainda não completou as aquisições
culturais no campo científico, é suficientemente rica de amor para
contribuir à sementeira de luz. Encontra-se, porém, desabrigada, entre
os companheiros invigilantes. Permanece sozinha e, assediada como está,
é suscetível de abater-se. Auxiliemo-la sem detença. ____A destra do Assistente espalmada sobre a cabeça de nossa respeitável irmã
expendia brilhantes raios, que lhe desciam do encéfalo ao tórax, qual
fluxo renovador.
____A médium, que antes parecia torturada, sopitando a custo a natural reação
às opiniões que ouvia, voltou à serenidade. Caiu-lhe a máscara de
descontentamento, dissipou-se-lhe a tristeza destrutiva; os centros_perispiríticos tornaram à normalidade; a epífise irradiou branda luz.
As nuvens de mágoa, que se lhe esboçavam na mente, esfumaram-se como por
encanto. Em suma, amparada pela atuação direta do meu orientador, Eulália
sabia dos percalços do trabalho e mergulhava-se gradativamente no ameno
clima da compreensão.
____Restabelecendo-lhe a tranquilidade, o instrutor, em seguida, conservou as
mãos apoiadas aos lobos_frontais, agindo-lhe sobre as fibras inibidoras.
Observei, então, nova mudança. A mente da médium, como que se
introvertia, desinteressando-se da conversação em torno e ficando mais
atenta ao nosso campo de ação. O contacto benéfico do Assistente
cortava-lhe, de modo imperceptível para ela, o interesse pelas referências
sem proveito, convocando-a a mais íntimo intercâmbio conosco.
____Com ternura paternal, Calderaro, conservando as mãos na mesma postura,
inclinou-se-lhe aos ouvidos e falou carinhosamente: — « Eulália,
não desanimes! A fé representa a força que sustenta o espírito na
vanguarda do combate pela vitória da luz divina e do amor universal.
Nossos amigos não te acusam, nem te ferem: tão somente dormem na ilusão
e sonham, apartados da verdade; exculpa-os pelas futilidades do momento.
Mais tarde eles despertarão para o esforço de espalhar-se o bem ...
Investigam com os olhos a superfície das coisas, mas seus ouvidos ainda não
escutaram o sublime apelo à redenção. Sigas para a frente. Estaremos
contigo na tarefa diária. E’ necessário amar e perdoar sempre,
esquecendo o dia obscuro, a fim de alcançar os milênios luminosos. Não
desfaleças! O Eterno Pai te abençoará.
____Reparei que Eulália não registrava aquelas palavras com os tímpanos de
carne. Encheram-se-lhe os lobos frontai s de intensa luz. As frases
comovedoras do instrutor represaram-se-lhe no cérebro e no coração,
quais pensamentos sublimes que lhe calam do céu, saturados de calor
reconfortante e bendito.
____Sim — respondia, do fundo d’alma, a devotada colaboradora, embora os lábios
se lhe cerrassem no incompreendido silêncio ..."
[25 - página 132] - André Luiz |