____Prosseguindo na exposição de casos notáveis de
fantasmas completamente materializados, penso que
o terceiro caso clássico no gênero é o da celeste
Nepenthés, fantasma que se manifestou no correr de
uma série especial de experiências em que interveio
a medianimidade_da_Senhora_d'Espérance. Nele se
verificou o famoso incidente de grande importância
teórica, qual o do Espírito que, declarando-se
contemporâneo da época heróica da antiga Grécia,
escrevia uma mensagem em grego antigo, no
canhenho de um dos experimentadores. O valor
teórico deste incidente toma vulto ainda maior
diante da feliz coincidência de ser o grego antigo
ignorado de todos os assistentes.
____A origem dessas memoráveis sessões é assaz
conhecida. Eminentes experimentadores
noruegueses, entre os quais se contavam professores
da Universidade, homens de letras, médicos,
magistrados e pastores luteranos, reuniram-se em
grupo com o fim de procurarem certificar-se até que
ponto as condições de preparação física dos
assistentes poderiam influir favoravelmente sobre a
produção dos fenômenos_metapsíquicos e, nesse
intuito, combinaram se abstivessem todos durante
seis meses...
- de qualquer bebida alcoólica,
- do fumo
- e
de outras drogas, devendo depois do terceiro mês
iniciarem uma série de doze sessões a que se
comprometiam todos a comparecer sem interrupção,
sendo aos mesmos vedado trazerem às ditas sessões
qualquer pessoa estranha ao compromisso.
____Representantes dos dois sexos se encontravam
em número igual no grupo que era composto de
cerca de trinta pessoas.
____Terminada a série de sessões, alguns
experimentadores publicaram-lhe a resenha em
livros e opúsculos. Extraí a que se segue do diário
da Baronesa Peyron (Light, 1907, 439) e das longas
citações do livro: Harper i Luften, publicado por um
magistrado que fazia parte do grupo, citações que a Senhora d'Espérance repetiu no correr de uma
conferência.
____Na relação norueguesa, o autor cita, depois de
prévia autorização, os nomes de quase todas as
pessoas que assistiram às sessões; a Senhora
d'Espérance, todavia, não se julgou autorizada a
outro tanto na sua conferência. (Light, 1903, págs.
547, 559 e 571. )
____Sabe-se, pelo diário da Baronesa Peyron, que o
organizador das sessões foi o Doutor Von Bergen, investigador metapsíquico assaz conhecido; e pela
conferência da Senhora d'Espérance, que o Senhor
Sjostedt foi o escolhido para dirigir as sessões.
Essas se realizaram na casa do professor E...
____As precauções tomadas, relativamente às salas
das sessões, não foram reveladas à médium, que
devia chegar de Gothembourg a Christiania. Não sei
por que razão, escreve a Baronesa Peyron, julgaram
inoportuno que a médium entrasse na sala das
sessões durante o dia, de sobre que, chegado o
momento de nos reunir, tivemos de perder muito
tempo em modificar as disposições que haviam sido
adotadas para a iluminação local. ____Nepenthés manifestou-se logo numa das
primeiras sessões e continuou a se manifestar em
quase todas as outras.
- Era uma forma de mulher da
maior beleza
- mostrava-se à luz ao mesmo tempo
em que a médium que estava acordada e se
conservava sempre fora do gabinete e assentada
entre as demais pessoas.
- Materializava-se no meio
do grupo, conformava-se com os desejos dos
investigadores, ora prestando-se em se deixar
fotografar, ora escrevendo no canhenho de um dos
assistentes, ora tirando o molde da própria mão em
parafina liquefeita.
____Este último fato foi narrado do modo seguinte
pelo Doutor Von Bergen:
- A espera trazia a toda impaciência e ansiedade.
Será bem sucedida? Não o será? - eram perguntas
que a si mesmo cada um fazia.
- Nosso estado da alma foi pressentido pela
médium, que nos fez observar: "Não me dirijam a palavra; preciso ficar quieta;
procurem guardar a calma e a serenidade".
- O leve ruído produzido pela mão, que
mergulhava no líquido e dele saía, continuou
durante alguns minutos na sombra da cortina,
enquanto percebíamos de modo completo a forma
branca debruçada sobre o recipiente. Depois Nepenthés se ergueu e virou-se para nós... olhando
em derredor, até perceber o Prof. E..., assentado por
detrás de outro experimentador, que o encobria de
metade; suspensa no ar, dirigiu-se então para ele,
entregando-lhe um objeto.
- "Ela me estende um pedaço de cera" - exclamou
ele; mas, depois, corrigindo-se: - "Não, é o molde da
mão, que está envolta até o punho e que se dissolve
no interior do seu modelo".
- Enquanto ele ainda falava, Nepenthés, que lhe
havia entregado o modelo de parafina, deslizava
tranqüilamente para o gabinete. Havia-se obtido,
enfim, o fenômeno desejado! Acabada a sessão,
examinou-se a moldagem. Exteriormente parecia
informe, grumosa, formada de grande número de
camadas sobrepostas de parafina; pela pequena
abertura do punho, percebiam-se interiormente os
lugares correspondentes aos dedos de mão
extremamente pequena.
____No dia seguinte levamos esta luva a um
modelador de profissão (um tal Almiri) para que
tirasse o modelo em gesso. Ele e os seus operários,
estupefatos, olharam para o modelo e, constatando
que mão humana, depois de havê-lo produzido, não
teria podido dele retirar-se, deixando-o intacto como
estava, acabaram por considerá-lo produto de uma
feitiçaria.
____Terminado o trabalho do modelador, todos
pudemos admirar a mão muito pequena e completa
até o punho, na qual se destacavam perfeitamente as
unhas e em que se desenhavam, com espantosa
nitidez, as linhas mais finas das juntas e da palma.
Os dedos fusiformes e admiravelmente torneados
assombravam os artistas mais do que qualquer coisa
outra e mais os convenceram da origem
supranormal do modelo, tanto mais que os dedos se
apresentavam dispostos de modo que mão humana
não teria conseguido assim sair da forma.
A maneira pela qual Nepenthés se
desmaterializava, no meio do grupo, é descrita neste
outro trecho:
- Nepenthés ficava despreocupadamente junto a nós,
- baixava lentamente a cabeça em que brilhava o seu
natural diadema.
- Em breve tempo, sem que se
percebesse o menor ruído, a sobre-humana, a
espiritual Nepenthés, tão bela, tão real, tão viva, se
havia transformado em pequena nuvem luminosa,
não maior que uma cabeça humana, sobre a qual
brilhava ainda o diadema; pouco a pouco essa
luminosidade se extinguia também, e o diadema se
dissolvia, desaparecendo por sua vez.
____Eis, enfim, o famoso episódio da mensagem
escrita em grego clássico, desconhecido da médium
e dos assistentes:
- ... Nepenthés se apresentou mais bela do que
nunca.
- Não obstante toda a admiração e o respeito
que nutro para com as amáveis e encantadoras
senhoras das minhas relações, devo dizer que meus
olhos jamais viram coisa alguma de comparável a
essa criatura sublime - mulher ou deusa, pouco
importa; - e estas minhas palavras mais não fazem
que traduzir a opinião geral.
- Percebendo o Senhor
E. .., debruçado sobre o seu canhenho, ocupado em
tomar notas, ela ficou um instante a olhá-lo
- O
Senhor E... convidou-a então a escrever para ele
uma frase e lhe entregou o lápis e o canhenho, que
ela aceitou.
- O Senhor E... levantou-se e colocou-se
por detrás dela, observando-a. Achavam-se ambos
ao lado da médium, mas um tanto para trás
- nós
olhávamos este grupo de três pessoas, em ansiosa
expectativa.
- Ela está escrevendo - disse o Senhor
E..., enquanto víamos as duas cabeças inclinadas
sobre os dedos que escreviam e cujos movimentos
eram distintamente percebidos.
- Pouco depois,
canhenho e lápis eram devolvidos ao Senhor E...,
que se assentou triunfante.
- Examinamos a página em que vimos traçados
caracteres gregos de forma muito clara, mas
ininteligíveis para todos os assistentes.
- No dia
imediato, fizemos traduzir a mensagem do grego
antigo para o moderno e, em seguida, para o nosso
idioma. E eis o que continha: "Eu sou Nepenthés,
amiga tua; quando tenhas a alma oprimida pela dor,
invoca-me e eu - Nepenthés - célere acorrerei a
aliviar-te os sofrimentos.
- Feliz mortal! pensávamos todos, ao felicitá-lo.
____Paro aqui com as citações. A propósito do caso
que acabamos de rapidamente percorrer, devemos
em primeiro lugar ter muito em consideração as
condições probatórias excepcionais em que tudo se
passou.
- O local estava permanentemente iluminado por
claridade suficiente para que todos se pudessem
reconhecer, para que as notas fossem tomadas
facilmente e tudo se distinguisse clara e
precisamente.
- A médium ficava assentada no meio
dos assistentes, a todos visíveis e sempre acordada.
- A médium tinha as costas viradas para o gabinete
medianímico onde se formavam os fantasmas
materializados, para saírem depois e se deixarem
ver pelos experimentadores.
- Quanto a Nepenthés,
ela se materializava e se desmaterializava quase
sempre na presença de todos.
- As condições de
experimentação eram pois absolutamente ideais
para tornar impossível toda e qualquer tentativa de
fraude.
____Não posso deixar de chamar a atenção para a
significação muito especial que ressalta de uma
personalidade materializada escrever em uma língua desconhecida da médium e dos assistentes, o que
vem mostrar quão destituída de base é a objeção
extravagante de que já me ocupei em relação a
casos análogos, mas em que as personalidades
medianímicas se exprimiam em língua ignorada do
médium, mas conhecida do consultante. Poder-se-ia
objetar, neste caso, que o médium captava o
conhecimento da língua, do subconsciente do
consultante. Já fiz ver que esta hipótese é de tal
modo absurda que os nossos próprios opositores não
ousaram jamais formular mas o que até aqui não
fizeram poderão fazê-lo um dia, em vista das
condições teóricas desesperadas em que se afundam
mais e mais. Daí o grande valor dos casos como
este, que oferecem prévio desmentido àquela
hipótese e mostram que o fenômeno se realiza
igualmente fora da presença de subconsciências que
possam fornecer ao médium os conhecimentos
indispensáveis, forçando, por conseguinte, a admitir
a presença real, in loco, de uma personalidade
espiritual estranha ao médium e aos assistentes.
____Afirmo, portanto, sem medo de me enganar, que
os casos de xenoglossia em que as personalidades_medianímica falam e escrevem correntemente
língua desconhecida do médium, considerados
conjuntamente com aqueles em que essas
personalidades falam e escrevem correntemente
língua desconhecida do médium e dos assistentes,
bastariam, só por eles, para demonstrar, de modo
irrefutável, a validade da hipótese espírita. E se
considerarmos que essas categorias de
manifestações, que lhe mostram a validade, são, em
verdade (como o meu presente trabalho disto dá a
prova), em número suficiente para firmá-la sobre a
base científica da análise comparada e da
convergência de provas, teremos motivos para nos
surpreender, vendo-a por tal forma combatida nos
próprios meios científicos. Mas todo o espanto
desaparecerá se nos lembrarmos que absurdos
semelhantes constantemente se repetiram através
dos séculos, sempre que no horizonte do progresso
humano surgia a aurora de uma grande ideia. [105 - páginas 176 / 183] - Ernesto Bozzano |