Singularmente
se equivocaria, quanto à nossa maneira de ver, quem supusesse que aconselhamos
se desprezem os fatos. Pelos fatos foi que chegamos à teoria. E certo que
para isso tivemos de nos consagrar a assíduo trabalho durante muitos anos e de
fazer milhares de observações. Mas, pois que os fatos nos serviram e
servem todos os dias, seríamos inconseqüentes conosco mesmo se lhes
contestássemos a importância, sobretudo quando compomos um livro para
torná-los conhecidos de todos.
Dizemos
apenas que, sem o raciocínio, eles não bastam para determinar a convicção;
que uma explicação prévia, pondo termo às prevenções e mostrando que
os fatos em nada são contrários à razão, dispõe o indivíduo a aceitá-los.
Tão
verdade é isto que, em dez pessoas completamente novatas no assunto, que
assistam a uma sessão de experimentação, ainda que das mais satisfatórias na
opinião dos adeptos, nove sairão sem estar convencidas e algumas mais
incrédulas do que antes, por não terem as experiências correspondido ao que
esperavam. O inverso se dará com as que puderem compreender os fatos, mediante
antecipado conhecimento teórico. Para estas pessoas, a teoria constitui
um meio de verificação, sem que coisa alguma as surpreenda, nem mesmo o
insucesso, porque sabem em que condições os fenômenos se produzem e que não
se lhes deve pedir o que não podem dar.
Assim,
pois, a inteligência prévia dos fatos não só as coloca em condições de se
aperceberem de todas as anomalias, mas também de apreenderem um sem-número de
particularidades, de matizes, às vezes muito delicados, que escapam ao
observador ignorante.
Tais
os motivos que nos forçam a não admitir, em nossas sessões experimentais,
senão quem possua suficientes noções preparatórias, para compreender o que
ali se faz, persuadido de que os que lá fossem, carentes dessas noções,
perderiam o seu tempo, ou nos fariam perder o nosso.
Allan Kardec [17b
página50 item34] Resumimos
nas proposições seguintes o que havemos expendido:
- 1 º
Todos os fenômenos espíritas têm por principio a existência da alma, sua
sobrevivência ao corpo e suas manifestações.
- 2 º
Fundando-se numa lei_da_Natureza, esses fenômenos nada têm de maravilhosos, nem de
sobrenaturais. no sentido vulgar dessas palavras.
- 3 º
Muitos fatos são tidos por sobrenaturais, porque não se lhes conhece a
causa; atribuindo-lhes uma causa, o Espiritismo os repõe no domínio dos fenômenos naturais.
- 4 º
Entre os fatos qualificados de sobrenaturais, muitos há cuja
impossibilidade o Espiritismo demonstra, incluindo-os em o número das
crenças supersticiosas.
- 5 º
Se bem reconheça um fundo de verdade em muitas crenças populares, o
Espiritismo de modo algum dá sua solidariedade a todas as histórias
fantásticas que a imaginação há criado.
- 6 º
Julgar do Espiritismo pelos fatos que ele não admite é dar prova de
ignorância e tirar todo valor à opinião emitida.
- 7 º
A explicação dos fatos que o Espiritismo admite, de suas causas e
conseqüências morais, forma toda uma ciência e toda uma filosofia, que
reclamam estudo sério, perseverante e aprofundado.
- 8 º
O Espiritismo não pode considerar crítico sério, senão aquele que tudo
tenha visto, estudado e aprofundado com a paciência e a perseverança de um
observador consciencioso; que do assunto saiba tanto quanto qualquer adepto
instruído; que haja, por conseguinte, haurido seus conhecimentos algures,
que não nos romances da ciência; aquele a quem não se possa opor fato
algum que lhe seja desconhecido, nenhum argumento de que já não tenha
cogitado e cuja refutação faça, não por mera negação, mas por meio de
outros argumentos mais peremptórios; aquele, finalmente, que possa indicar,
para os fatos averiguados, causa mais lógica do que a que lhes aponta o
Espiritismo. Tal crítico ainda está por aparecer.
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